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sexta-feira, outubro 05, 2007

Livraria de Montaigne


“Sou humano e considero que nada de humano me é estranho”. Essa é uma das frases impressas na exposição “Um passeio ao universo do escritor francês Michel de Montaigne”, que será aberta nesta terça-feira (9), a partir das 10h00, na Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Na mesma ocasião será lançado o livro do projeto de autoria do professor e coordenador José Alexandrino de Souza Filho.
A exposição faz parte do projeto Livraria de Montaigne, que trata de uma réplica, em miniatura, da torre que funcionou como biblioteca para o referido escritor, confeccionada em grossas folhas de isopor, cola e papel. A torre está exposta no hall da Biblioteca Central da UFPB e vem chamando a atenção dos estudantes, professores e freqüentadores da Biblioteca Central.
Ela tem seis metros de altura, três de diâmetro e oito de circunferência. Frases do escritor francês Montaigne estão fixadas no teto da torre em francês, grego e latim. O projeto é bilíngüe e abarca tanto lusófonos como francófogos. Essa não é a primeira vez que o projeto da Livraria de Montaigne é exibido ao público. Ela foi exposta pela primeira vez em 1997, mas como o professor Alexandrino teve que sair para o doutorado na França precisou guardar o material da exposição.
A idéia do projeto, de acordo com o professor Alexandrino de Souza Filho, surgiu quando foi ministrar uma disciplina no curso de especialização em língua e literatura francesa na UFPB e resolveu aprofundar os autores do século 16. O curso era sobre dois autores, em prosa, e um deles foi Montaigne. O resultado foi uma coletânea de trabalhos escrita pelos alunos e publicada pelo Centro de Ciências, Letras e Artes (CCHLA), em janeiro de 1997, todo em francês, com ilustrações da época.
Em seguida, os professores do Departamento de Letras foram convidados a fazer um mural dos escritores de sua preferência. Foi quando sugeriu o escritor Montaigne. “Como tinha conhecido a livraria dele na França decidi fazer uma réplica da livraria. Foi um ano de trabalho intenso. Na época tive apoio da Funape, da Embaixada de França, Prefeitura, Governo do Estado e empresas locais”, disse.
Na primeira exposição os índios da Baía da Traição foram convidados a participar do lançamento, onde fizeram um batismo ritual. “Essa parada do projeto, de certa forma foi bom, pois tive a oportunidade de ampliar o projeto”, comentou.
Nesta edição, o projeto inclui, além da torre, um portal em tamanho real, painéis com informações sobre o escritor e um jardim desenhado no chão que conduz o visitante ao mundo de Montaigne. A idéia é fazer com que o visitante faça um passeio pelo jardim e vá até a torre, que é o núcleo da exposição, tal qual acontece na França.
O nome, “Livraria de Montaigne”, era como se chamava, no século 16, na França, as bibliotecas, as livrarias, lugar de livros. Não se conhece na história da literatura e filosofia uma biblioteca semelhante a está de Montaigne, que além dos livros continham frases fixadas no teto para criar um ambiente sagrado, como se fosse um lugar privilegiado e para poucos.
As frases, impressas no teto, de acordo com o professor Alexandrino, foram tiradas da bíblia, outras são de autores gregos e latinos. É um mundo impregnado de filosofia, de pensamento, de ideais, de reflexão e meditação. Montaigne acreditava que o homem era feito para ação e para contemplação.
Ele também tinha grande interesse pelas culturas ditas primitivas. Foi o primeiro humanista a defender os índios, que eram acusados, pelos descobridores (espanhóis e portugueses), de serem selvagens e bárbaros, ou seja, povos sem cultura, sem civilização, mais próximos aos animais do que dos seres humanos. Montaigne desconstruiu esse argumento, que na verdade, era apenas uma desculpa para explicar o genocídio dos índios na sua época.
Montaigne, diz Alexandrino, tem uma ligação interessante com o Brasil, pois escreveu vários ensaios sobre os índios canibais brasileiros, em que dizia ter essa ligação e possuir objetos indígenas. “Ele transformou a biblioteca dele em um gabinete de curiosidades”, comentou o professor. Os objetos indígenas foram obtidos quando ele se encontrava na França, no século 16, com um grupo de índios brasileiros que para lá haviam sido levados pelos traficantes franceses do Pau Brasil que freqüentavam muito a Paraíba, pois, a Paraíba tinha um clima propício para o cultivo da árvore, uma vez que a planta gosta de muito sol. O melhor Pau Brasil do Brasil, de acordo com Alexandrino e Montaigne, era da Paraíba. Os colonizadores franceses penetravam pelo Rio São Domingos, como era chamado antes do Rio Paraíba, seguia até brejo paraibano em busca da árvore mais conhecida do país.
As histórias e situações sobre Montaigne estão espalhadas em vários websites na internet. Michel Eyquem de Montaigne nasceu em 28 de fevereiro de 1533 em château de Montaigne e faleceu em 13 de setembro de 1592, no mesmo lugar. Foi escritor e ensaista francês, considerado por muitos como o inventor do ensaio pessoal.
As suas obras e, mais especificamente nos seus "Ensaios", analisou as instituições, as opiniões e os costumes, debruçando-se sobre os dogmas da sua época e tomando a generalidade da humanidade como objeto de estudo. É considerado um céptico e humanista.
Exerceu a função de magistrado em Périgoux (de 1554 a 1570) depois em Bordéus onde travou profunda amizade com La Boetie. Retirou-se para o seu castelo quando tinha 34 anos. Para se dedicar ao estudo e à reflexão. Levou nove anos a redigir os dois primeiros livros dos ensaios. Depois viajou por toda a Europa durante dois anos (1580-1588). Faz o relato desta viagem no livro Journal de Voyage, que só foi publicado pela primeira vez em 1774. Foi presidente da Câmara em Bordéus durante quatro anos. Depois regressou ao seu castelo e continuou a corrigir e a escrever os ensaios. Os seus Ensaios compreendem três volumes (três livros) e em três versões: Os dois primeiros em 1580 e 1588. Na edição de 1588 aparece o terceiro volume. Em 1595, publicou uma edição póstuma destes três livros com novos acrescentos.
Os ensaios são um auto-retrato de um homem, mais do que o auto-retrato do filósofo. Montaigne apresenta em toda a sua complexidade e variedade humanas. Procura também encontrar em si o que é singular. É autor de frase celebres como: “A palavra é a metade de quem a pronuncia, metade de quem escuta”; “Existem derrotas mais triunfantes que as vitórias” e tantas outras.

Frases de Michel de Montaigne

Montaingne

* Os homens tendem a acreditar, sobretudo, naquilo que menos compreendem.
* O homem não é tão ferido pelo que acontece, e sim por sua opinião sobre o que acontece.
* Não me encontro onde procuro, mas de repente, quando menos espero.
* Apenas pelas palavras o ser humano alcança a compreensão mútua. Por isso, aquele que quebra a sua palavra atraiçoa toda a sociedade humana.
* Ensinar os homens a morrer é ensiná-los a viver.
* Nós podemos chegar a ser cultos com conhecimento de outros homens, mas nós não podemos ser sábios com sabedoria de outros homens..
* Eu não recolhi um ramo de flores de outros homens, mas a linha que os liga é meu própria.
* O que o teme sofre, sofre já de seu medo
* A menos que um homem sente que tem uma memória bastante boa, ele nunca deve arriscar-se encontrar-se
* Eu sei bem do que eu estou fugindo, mas não o que eu estou buscando.
* Eu entendo que os prazeres devem ser evitados se as dores forem a grande conseqüência, mas se as dores forem cobiçadas, elas terminarão em prazeres mais grandes.
* É uma presunção perigosa e fútil, além de uma absurda temeridade, ter desprezo pelo que nós não compreendemos.
* Que eu sei?

Adriana Crisanto
Repórter
Fotos: Ovídeo Carvalho
* Matéria publicada no caderno Show do Jornal O Norte, em maio de 2007.