
O monólogo do funcionário público fala de um anônimo apaixonado pela filha do chefe que vive a fantasia esquizofrênica do poder e da riqueza. A interpretação estilizada é do ator André Morais (o arrecadador de prêmios do vídeo Alma) e direção do arquiteto, ator e diretor Jorge Bweres, integrante do Grupo de Teatro Bigorna.
O texto é de autoria do russo Nikolai Gogol, escrito no século 19, fase áurea do realismo russo. A montagem constrói um funcionário público que é a encarnação da insignificância humana. Em cena um personagem pobre, solitário, que ocupa a função de apontador de penas de escrever que vive num pequeno quarto.
Para escapar de todas as mazelas de sua vida cria para si um mundo de fantasias. Ele da origem, na primeira parte do espetáculo, uma identidade que vai crescendo até se sentir um rei. A segunda parte da montagem o coloca em um manicômio. A todo o momento estão presentes as metáforas sobre a alienação em questões sociais da loucura mostrando que, na cisão entre realidade e desejo, entre o mundo que se oferece para ser vivido e o mundo a que não se tem acesso, cria-se um abismo que cinde a personalidade.
O cenário é de autoria do próprio André Morais e traz inúmeras páginas de diários. “A idéia é que a peça se passe dentro das folhas deste diário”, explicou Morais no programa do espetáculo. A música foi composta pelos estudantes do Laboratório de Composição Musical da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), Samuel Correia, Marcílio Onofre, Wilson Guerreiro, sob a orientação do regente Eli-Eri Moura. O figurino é assinado por Suzy Torres e Graça Morais.
A iluminação tenta não apenas representar espaços ou reforçar situações dramáticas, mas de acordo com o diretor, Jorge Bweres, coloca Sophie, sua paixão e o herói da trama, em luz brilhante que encanta e faz sonhar. “A luz constrói ambientes e divide a encenação em diferentes planos, profundidades e alturas”, comentou o diretor-iluminador.
O texto foi adaptado para o teatro em várias casas de espetáculos no Brasil e na Europa. Uma destas montagens salvou o Teatro do Rio de uma crise financeira que parecia irreversível. No ano de 1997, Diogo Vilela retomou o papel, com encenação de Marcus Alvisi. O diretor deu ao texto um tratamento leve, centrado mais na personagem do que no mundo que o esmaga. A intimidade que se cria entre o ator e a platéia é utilizada por Diogo Vilela com uma interpretação olho a olho e a projeção da interioridade do personagem.
O ator André Morais diz que o processo desse diário compreender o quanto o humano pode ser frágil e simples. “Mergulhar no universo de Gogol me fez sentir uma alma morta e ao redor de almas mortas, alienadas, mesquinhas e egoístas com uma ilusão de um ideal de felicidade social. E quanto a ascensão pode ser dura para muitos”, descreve o ator no encarte da montagem.
Está também não a primeira vez que os textos de escritores russos são adaptados por atores em João Pessoa. O grupo de teatro Piollin, em 2003, apresentou “Woyzeck”, do dramaturgo alemão Georg Büchner (1813-1837) que adaptada pelo ator Matheus Nachtergaele recebeu o nome de “Woyzeck, o brasileiro”, que teve no elenco os atores paraibanos Everaldo Pontes, Servilho e Soia Lira. A peça foi encenada em várias capitais do país, menos na Paraíba.
Nikolai Vasilievich Gogol? - Nasceu na Ucrânia, mas viveu em Moscou. Foi um escritor russo de origem ucraniana. Apesar de muitos de seus trabalhos terem sido influenciados pela sua herança ucraniana, ele escreveu em russo e é considerado parte da literatura russa. Seu pai, antigo oficial cossaco, desenvolveu seu gosto pela literatura. Sua mãe lhe transmitiu a fé religiosa, que veio a acarretar, à beira da sua morte, em um misticismo doentio. Após os estudos deixou a Ucrânia para trabalhar num escritório em São Petersburgo, num ministério. A distância de seu país natal e a nostalgia que dela resulta, lhe inspiraram alguns dos seus escritos. Mesmo não sendo um medíocre empregado, a experiência lhe inspirou uma magnífica novela, O Capote (1843), cujo herói, Akaki Akakievitch, tornou-se o arquétipo do pequeno funcionário russo.
Logo depois Gogol consegue uma cadeira de professor de História no Instituto Patriótico de Jovens Moças, e em seguida, na Universidade de São Petersburgo. Durante este período, ele publica numerosas novelas. Em 1836, a peça de teatro “O Inspetor Geral” conhece um real sucesso em São Petersburgo, aplaudida pelos liberais e atacada pelos reacionários; Gogol se sente incompreendido, tanto irritado por aqueles que lhe apóiam quanto por aqueles que lhe criticam, pois, segundo ele, todos simplificam e deturpam seu pensamento profundo, pensam que ele ataca as instituições, de uma maneira quase militante, sendo que ele não quer denunciar senão os vícios e os abusos que se encontram no interior da alma humana.
Ele é autor do romance “Almas Mortas”. Ele tenta publicá-la em Moscou em 1841; mas o Comitê Moscovita de Censura recusa. Não é senão após uma intervenção dos amigos do autor que o livro é publicado em 1842. Este romance é uma descrição sem concessão da Rússia profunda, uma sátira às vezes impiedosa, porém onde guarda subjacente, de maneira permanente, o profundo amor de Gogol pelo país.
Em 1848, faz uma peregrinação em Jerusalém. Pouco a pouco sua saúde fica abalada e mais ainda a percepção que ele tem da mesma, pois ele se crê sempre mais doente do que de fato - e seu sentimento religioso se exalta: ele se torna cada vez mais místico.
Morre no dia 21 do mesmo ano, fatigado pelos jejuns. Está enterrado no cemitério de Novodevitchi, em Moscou. É autor das obras: Almas Mortas, O Nariz, O Capote, O Retrato, Taras Bulba, O diário de um louco, O Inspetor geral, Arabescos, Serões na propriedade de Dikanka, Vij e Uma terrível vingança.
Serviço:
Diário de um Louco (monólogo)
Quinta-feira (28)
Hora: 21h00
Local: Teatro Santa Roza
Em cartaz nos dias 29 e 30 junho e 1 de julho; dias 7 e 8 de julho, sempre as sextas e sábados (às 21h00) e domingos (20h00).Ingressos: R$ 10,00 (inteira) e R$ 5,00 (estudante).
Foto: Divulgação
Adriana Crisanto
Repórter
adriana@jornalonorte.com.br
adrianacrisanto@gmail.com