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quarta-feira, junho 21, 2006

Enigma de uma mostra em revista


Adriana Crisanto

Com o objetivo de levantar questionamentos sobre os aspectos técnicos e discursivos das artes visuais os artistas plásticos, Dyogenes Chaves e Rodolfo Athayde, montaram a exposição intitulada “Hwang” que será aberta nesta quinta-feira (9), às 20h30, na Usina Cultural Saelpa, localizado no bairro de Tambiá em João Pessoa.
No mesmo dia e local acontece também o lançamento da “Revista Primeira Pessoa” que recebeu o patrocínio do Programa BNB de Cultura e do livro “Núcleo de Arte Contemporânea da Paraíba/NAC (Edição Funarte). Em seguida, acontece o show da banda “The Sylvias”.

A Exposição

O enigma desta mostra está não apenas no nome “Hwang” que remete ao cientista sul-coreano Woo-Suk Hwang que protagonizou a maior fraude científica dos últimos tempos, ao insistir que possuía a tecnologia necessária para a chamada clonagem terapêutica e disse ter sido enganado por cientistas-júniores de sua equipe.
A exposição, de propósito, contém obras que nos remetem às questões técnicas das artes plásticas (fraudulentas ou não) caso da apresentação de algumas pinturas realizadas pelos dois artistas, individualmente, ainda nos anos 1990, ou de atuais fotografias digitais, manipuladas por modernos programas de computador, de autoria de Rodolfo Athayde, como também pela possibilidade de abordar questões conceituais e subjetivas, e que mesmo sendo pertinentes à arte podem também ser vinculadas a outros campos, como a política ou o bem-estar social da sociedade.
Mesmo sendo de gerações diferentes, Dyogenes e Rodolfo, expõe de forma proposital e praticamente tem o mesmo discurso. Algumas telas foram pintadas há tempos atrás, mas permanecem atuais nas suas propostas. Na opinião de Dyogenes Chaves no que se refere as questões da função e do significado da arte, hoje estão em sintonia com as transformações sociais, políticas e econômicas que atravessamos nos âmbitos local e mundial. “Para os artistas, a arte não está desassociada de jeito nenhum da vida (e de tudo que está em volta dela) e do planeta (e de tudo que está dentro e fora dele)”, comentou.
Rodolfo Athayde é um pintor premiado em vários salões de arte nas décadas de 1980 e 1990. “Somos herdeiros de todas as vanguardas do século vinte”, disse Dyogenes. E Rodolfo arremata: “Embora, a arte tradicional, como diria Hwang, só deixará de existir com a eliminação do futuro”. Rodolfo aproveita a ocasião para também mostrar algumas “fotografias” digitais, manipuladas recentemente, e cutuca o meio: “A fotografia de hoje, quando muito pode ser arte, mesmo, com a sedutora possibilidade de deixar de ser fotografia, ou não”.
Quanto ao título da exposição “Hwang”, os artistas dizem que embora, para eles, Hwang pode significar muita coisa. Desde a prova (ainda bem) de que “Deus existirá por toda a eternidade”, até a possibilidade de trazer à tona assuntos banais e locais: “Um dia a Lagoa transbordará e como um Tsunami ao revés umedecerá todas as malditas e repetitivas memórias locais”, diz Rodolfo. E deixam no ar uma pergunta (ou afirmação?): A pintura para ser atual tem que ser pintada hoje?

A Revista

A primeira edição da “Primeira Pessoa”, que também está disponível na internet, através do website www.primeirapessoa.com.br, é dedicada a memória do fotografo Marcos Veloso e do poeta anarquista Eric Unglas e idéias sopradas pelo músico Pedro Osmar.
O produto cultural “da casa”, nesta primeira edição, vem com concepção gráfica e visual inovadores. A mudança lingüística vai desde a embalagem em sacos plásticos de padaria, passando pela diagramação até a escolha dos gêneros jornalísticos, essencialmente “informativo e opinativo”.
Para quem se queixava da falta de um veículo especializado para discutir as artes “engajadas”, urbanas, modernistas e contemporâneas têm agora um espaço totalmente dedicado às artes plásticas. São 29 folhas em papel jornal claro, nas cores branca e preta, editada por Dyogenes Chaves e o jornalista Fábio Queiroz, que volta a escrever sobre o que mais gosta e preparou duas entrevistas para a Primeira Pessoa. Uma delas com o jovem artista Sidney Azevedo e outra com a professora Rosires Andrade, que criou o projeto Artes Visuais do Centro Cultural de São Francisco, localizado no centro histórico de João Pessoa.

Um dia de sol

A revista, segundo seus idealizadores, dá a maior importância aos relatos de experiências realizadas no Nordeste. Nesta primeira edição eles resgatam uma das mais polêmicas intervenções artísticas que aconteceu em João Pessoa, em 1978, quando o artista plástico Chico Pereira, em pleno verão daquele ano, recolheu todo o lixo produzido pelos banhistas nas praias de Cabo Branco, Tambaú e Manaíra, e colocou na frente do Hotel Tambaú, que representava, naquela época, o maior monumento turístico do Estado.
A intervenção foi reportada pelo jornal O Norte, no dia 4 de fevereiro de 1978 e republicado no Almanac numa edição da Funarte (NAC/UFPB), no mesmo ano. Apesar de todo mistério que envolveu a montagem, o público se presente e as reações foram as mais variadas.
Chico Pereira lembra que o lixo, que estava pendurado em sacos transparentes, confeccionados especialmente para intervenção, apareceu no outro dia espalhado na calçada da feirinha de Tambaú. A exposição foi documentada em foto e filmada em super 8 desde o amanhecer do dia, com as pessoas chegando na praia, até o final da tarde. Naquela época, disse Chico, o secretario de infra-estrutura do município era Antônio Augusto Almeida, que sensível a causa do artista, disponibilizou os funcionários da empresa de lixo para reconhecer o material.
“Em 1978 pouco se falava em preservação ambiental. Em arte e ecologia muito menos”, comentou o artista que consciente de sua posição de artista levou já naquela época a população a questionar também sobre a rapidez da informação e como sua digestão (e indigestão) representam um processo de absorção e rejeição natural como os efeitos dos materiais sintéticos.
Por outro lado, diz o artista, a praia num dia de sol representa um espaço físico de lazer para todos. O lixo resultante dessa ocupação serve de matéria prima para qualquer estudo ou análise social, econômica ou cultural do que ali possa ter acontecido.

Quem é Hwang?

Woo-Suk Hwang é um cientista sul-coreano que recentemente pediu perdão por ter fraudado estudos sobre clonagem humana, mas prometeu que apresentaria células-tronco embrionárias feitas sob medida se tivesse mais seis meses e um estoque de óvulos humanos à disposição.
O pesquisador, que protagonizou a maior fraude científica dos últimos tempos, insistiu que possui a tecnologia necessária para a chamada clonagem terapêutica e disse ter sido enganado por cientistas-júniores de sua equipe. Numa entrevista para imprensa americana disse também ter ficado "enlouquecido e cegado" em sua obsessão por fazer avançarem os estudos com células-tronco.
Na última terça-feira, um painel da Universidade Nacional de Seul, onde Hwang trabalhava, divulgou a conclusão de uma auditoria que afirmava que Hwang fabricara os resultados de um artigo científico seminal, publicado em 2004 na revista "Science", no qual descrevia ter criado o primeiro embrião humano clonado para a obtenção de células-tronco com o genoma do próprio paciente, sem risco de rejeição.
No fim do ano passado, o mesmo painel havia concluído que outro estudo de Hwang, mais recente, sobre células-tronco embrionárias humanas também havia sido falsificado. "Eu me responsabilizo inteiramente pelos dois artigos e lhes peço perdão", disse Hwang numa entrevista coletiva ontem na capital sul-coreana. "Eu me sinto tão triste que é difícil até pedir desculpas", afirmou. "Levarei o resto da vida corrigindo meus erros. Não posso pagar completamente essa dívida até morrer. Nós ficamos enlouquecidos com esse trabalho, e eu fui cegado", continuou o ex-herói nacional coreano, à beira das lágrimas.
Hwang, que havia se tornado um ídolo para muitos sul-coreanos e recebido US$ 65 milhões do governo para suas pesquisas, estava recluso desde 23 de dezembro, quando pediu demissão da Universidade Nacional de Seul depois que foi divulgado o primeiro resultado da auditoria.
Seus estudos alimentaram esperanças de pessoas que sofrem de doenças degenerativas porque pareciam ter aberto o caminho para o dia em que tecidos específicos de um paciente pudessem ser cultivados em laboratório para ajudar a reparar órgãos com defeito e tratar enfermidades até agora incuráveis.

Serviço:
Hwang - Exposição dos artistas plásticos Dyogenes Chaves e Rodolfo Athayde

Abertura nesta quinta-feira (9)
Hora: 20h30
Local: Usina Cultural Saelpa – Tambiá
Lançamento da Revista Primeira Pessoa
Show com a banda The Sylvias