Cultura paraibana perde um dos ícones do teatro e do cinema para Covid-19
Em meio a
tantas dores e ainda envolvidos na ressaca desse vírus mortal faleceu nesta
quarta-feira, dia 2 de fevereiro de 2022, o professor, dramaturgo, roteirista, cineasta
Elièzer Rolim. Paraibano de Cajazeiras (PB) que fez muito pela cultura de nosso
Estado. Ele faleceu aos 61 anos, vitimado pelo Sars-cov2, no Hospital Nossa
Senhora das Neves, em João Pessoa.
Elièzer Rolim
apresentou sintomas leves do vírus, mas no 10º dia o quadro de saúde dele se
agravou e precisou ser internado. Teve uma embolia pulmonar e na quarta-feira,
pela manhã, veio a óbito. A notícia logo correu de João Pessoa a Cajazeiras,
cidade onde nasceu. Os artistas, alunos, professores, amigos e colegas de
profissão lamentaram profundamente o falecimento e a perda para cultura local
do grande artista e homem da cultura.
O dramaturgo,
diretor, ator, Tarcísio Pereira, indignado com a imprensa blogueira sem noção
da cidade (que faz tudo pelo furo sem checar os fatos e escutar as pessoas), divulgou
um vídeo em que, visivelmente emocionado, falava da importância dele para o
teatro e o cinema paraibano. “Respeito a história do cinema, mais ele era um
homem mais premiado do teatro paraibano. Foi um dos pioneiros do Teatro
Paraibano, junto com o pessoal do Piollin”, comentou o diretor no vídeo que
circula pela internet e os grupos de Whatsapp.
“O cinema para
mim é um ato de criação e como ato criativo ele cabe tudo”, comentou Elièzer
Rolim, no documentário produzido pela TV Câmera de João Pessoa, na Revista do
Cinema. O primeiro set de filmagem dele foi no filme “A hora da estrela”, que
tinha como protagonista principal a atriz paraibana, Marcélia Cartaxo. Ele era
formado em arquitetura e urbanismo da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e
foi para São Paulo quando fez o primeiro curso de roteiro.
As histórias
contadas por Elièzer Rolim sobre o cinema e o teatro paraibano, como seu
contato com Machado Bittencourt, do qual foi chamado para ser assistente em um
filme do cineasta no Piauí, estão neste vídeo doc da TV. “Sempre trabalhei com teatro e o cinema, e o teatro
têm uma conexão maravilhosa”, dizia Elièzer que era da quinta geração da
família do Padre Rolim, fundador da cidade de Cajazeiras, que lhe rendeu a
gravação do filme sobre Padre, o “O Sonho de Inacim”, que teve como protagonista
principal o ator José Wilker e ainda José Dummont e Marcélia Cartaxo. Um filme
lendário que marca o início do cinema digital na Paraíba.
O
professor de teatro, diretor e ator, Everaldo Vasconcelos, contou que conheceu
Elièzer em 1977, na I Semana de Teatro Universitário de Cajazeiras para uma
apresentação teatral no quintal de sua casa. “Depois testemunhei o crescimento
de seu talento, tanto como dramaturgo, como encenador, nas muitas vezes que
veio a João Pessoa com o Grupo de Teatro Terra participar dos encontros
promovidos pela Escola Piollin. Lembro, também, da vez que pude acompanhar, em
1982, junto com toda a equipe da Escola Piollin, o Grupo Terra ao Festival de
Teatro de São José do Rio Preto, que lá foi apresentar o espetáculo Beiço de
Estrada”, contou Everaldo Vasconcelos.
Todas
as pessoas que conversei para construção deste texto sobre Elièzer Rolim foram
unânimes em dizer que ele foi um amigo, um profissional, um diretor, roteirista
muito humano. “Era uma pessoa de uma espiritualidade acolhedora, extremamente
discreto, que se preocupava com o crescimento espiritual das pessoas. Era uma
pessoa que sabia ter compaixão. Fluía de suas mãos uma energia boa”, comentou
Everaldo Vasconcelos sobre a pessoa do Elièzer.
Novo espetáculo - O ator e diretor de
teatro, Edilson Alves, comentou que “Eu vi o Céu” seria o mais novo espetáculo
escrito e dirigido por Eliézer, com a montagem do Grupo Agitada Gang. “Tínhamos
até tentado no prêmio Parrá para montagem teatral, através da Lei Aldir Blanc,
mas não foi aprovado, será que Aldir Blanc já sabia que iria chamar Eliezer
para verem o céu juntos? Ou não seria para Eliézer escrever poesia e
dramaturgia para Aldir Blanc compor? Não sabemos, o que eu sei e que não temos
mais nosso diretor”, escreveu Edilson em entrevista pelo Whatsapp.
Edilson
Alves conta também que ele tinha um mantra que era: “nove vezes obrigado”. “Ficaria
horas escrevendo sobre Eliézer, ficaria anos fazendo teatro com ele, ficaria
muito tempo ouvindo Eliézer”, relatou o ator de “Como nasce um cabra da peste”,
que disse que foi com o Elièzer que fez sua primeira viagem internacional. “Levando
a nossa arte para os portugueses assistirem, nossos irmãos além-mar, se
deliciaram com as histórias de Eliézer, se divertiram com o sertão de Cajazeiras,
que levamos para o palco e também se emocionaram com a miséria nordestina, com
a dor da perca de alguém que vai embora, exatamente como estou hoje, doido,
sofrido e sentido a falta do parceiro, do diretor e do amigo da cena teatral
paraibana”, relatou o ator.
Sobre
o teatro Edilson Alves contou que Eliézer Rolim se apaixonou pelo teatro, pelo
Grupo Mickey, pelos piralhos no Grupo Piollin, pelas duas senhoras “Sinhá e
Flor”, como também encantou com “Pucumã”, na Cia Oxente, Mamanita, Pinochio,
Rei do Lixo, Homens de Lua, Anjos de Augusto. “E porque não Vau da Sarapalha,
não necessariamente nesta ordem, mas o que importa? O que importa é que ele foi
o homem do teatro, bebeu, sonhou, dividiu, criou, imaginou, idealizou a arte de
representar, a arte de encantar ao vivo, a cores e em alguns momentos em preto
e branco. Inclusive, quando me convidou para ser seu assistente de direção da
encenação da Paixão de Cristo, em João Pessoa, foi lindo, inúmeros atores e
atrizes, técnicos e técnicas, criadores e criaturas a sua disposição para
encantar a plateia gigantesca, exatamente como ele foi, gigante”, acrescentou
Edilson Alves, que revelou ainda que ele tinha o sonho de fazer um
longa-metragem do espetáculo “Como nasce um cabra da peste”, que vai ficar para
nossos melhores sonhos.
O professor Doutor Fernando Abath Cananéa comentou que Eliezer Rolim era um ser humano de excepcional competência intelectual e artística. “A Paraíba lhe reverência como um dos grandes nomes de nossa vida cultural. O teatro, o cinema e a academia perde uma de suas maiores expressões”, disse Fernando que comanda junto a esposa Ailsa a Ong Maré Produções Artísticas e Educacionais.
O
Conselho de Arquitetura e Urbanismo da Paraíba (CAU/PB) publicou em suas redes
sociais nota de pesar sobre o falecimento do arquiteto e urbanista Elièzer
Rolim, que era filiado ao conselho. Instituições culturais da cidade de João
Pessoa, como a Funesc e Funjope, por onde Eliézer Rolim passou também renderam
homenagens a esse grande arquiteto das artes. Ele deixa sua esposa Rosângela, um filha Mirna Rolim e um filho Kauê, do primeiro casamento.
Velório – O sepultamento de Elièzer
será Morada da Paz, localizado no bairro de Jaguaribe, em João Pessoa, até
amanhã, dia 3 de fevereiro, às 13h, quando o corpo segue para Natal (RN), onde
será cremado atendendo um pedido do próprio Elièzer Rolim.
Sobre Eliézer Leite Rolim Filho - Natural
de Cajazeiras (PB), morava em João Pessoa. Era graduado em Arquitetura e
Urbanismo pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB/1986). Mestre em Artes
Cênicas pela Universidade Federal da Bahia (UFBA/2001). Atuou no teatro,
cinema, sendo roteirista, diretor e produtor. Membro atuante da Academia
Paraibana de Cinema. Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela UFBA (2010-2013),
com estágio no laboratório Le Cresson na École Nationale de Architecture de
Grenoble, na França. Participou da equipe de organização do I Seminário
Internacional Urbicentros: Morte e Vida dos Centros Urbanos (2010). Participou
da organização e ministrou oficinas no IV Seminário Internacional Urbicentros
(2013). Pesquisa e trabalho de extensão com temas ligados a espetacularização
urbana, teatro, cenografia, ambiances espetaculares e espaço teatral. Foi
coordenador do Teatro Minerva do Centro de Ciências Agrárias/Campus II na
cidade de Areia/PB. Exercia a função de professor adjunto na UFPB, no curso de
Arquitetura e Urbanismo.
Texto publicado na Coluna do Parlamento PB.